Conto para ler num galope de tarde... unfinished.
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Horário: Final de tarde, sol laranja esparramado pelo céu.
A menina estava apoiada sobre os cotovelos e espiava a janela. Imaginava.
Poderia até ser que chovesse, não seria mau. Fitava distraída o céu e suas transformações, parecia pressentir o que estava para acontecer.
O vento assoviava quase como uma melodia, e para ela todo som era uma lembrança, ardida como ferida aberta.
Estava frio, seus pés reclamavam.
Não sabia o que sentia, não sabia o que pensava, parecia meio inconsciente, fora de tudo, já estava estática naquela posição fazia um tempinho.
Se não se mexia, sua mente ao menos percorria diversos lugares, não parava.
E já faziam alguns dias que não saia de sua casa.
Quanto tempo?
Enquanto isso, o moleque estava na casa dele, revirando algumas caixas.
Parecia inquieto.
Apesar de todo desejo do mundo, ele não chorava. Não conseguia. Tentava, mas seus olhos pareciam estar secos, por mais que ele se esforçasse, parecia que não haviam mais lágrimas guardadas em seus olhos.
Estava se sentindo muito mal, não sabia mais o que poderia fazer para melhorar, e desesperadamente se agarrava a esperança de que, se conseguisse chorar, tudo melhoraria. Mas parecia que tinha esquecido como fazer, fazia tanto tempo desde a última vez que havia vertido lágrimas que não sabia ao certo se havia um dia mesmo chorado, ou se tinha sido tudo imaginação.
E isso o deixava mais agoniado, "a gente sempre esquece tanta coisa, mesmo as mais importantes".
Foi até a pia e começou a molhar os olhos, em uma patética tentativa de fazê-los reaprender a chorar.
Sem sucesso, correu para o quarto e tentou pingar colírio.
Não adiantou.
Tolo...
A menina se levantou, estava se sentindo pesada, cansada. Andou um pouco até a sala. Já havia pensado demais.
Se arrependeu, não tinha ânimo. Foi voltando, arrastando suas meias de volta para a cadeira. Sentou-se.
Estava impaciente? Com o quê?
Ele já tinha desistido depois de tanto esforço quando, como se o problema fosse algum encanamento entupido, sem avisos veio. As lágrimas começaram a rolar, a fluir abundantemente de seu rosto, abandonando, rasgando selvagemente seus olhos, descendo em rios e corredeiras sem parar. Não parecia ser possível que alguém pudesse chorar tanto, era realmente impressionante.
O moleque até parecia que estava tendo espasmos. Soluçava muito, não conseguia falar, estava em desespero.
O que era aquilo?
Estava irreconhecível.
Um trovão soou ao longe anunciando a tempestade. As primeiras gotas mal começaram a tilintar no vidro e a menina já estava com o rosto e as mãos coladas na janela.
Muitas gotas. Muitas. A menina, protegida pelo vidro, apoiava suas mãos na janela como se quisesse tocar a chuva.
Mas tinha medo. Se abrisse a janela talvez não conseguisse mais fechar, e a tempestade estava violenta, parecia ser uma das piores dos últimos tempos.
Tudo isso levava a acreditar que ela iria se limitar a assistir o espetáculo em seu quarto protegida, quando em um ato inconseqüente, surpreendente como sempre, ela abriu a janela.
A tempestade se transportou para seu quarto.
Era o caos.
Não se desesperou. Foi até a cozinha. Sua camisa estava ficando ensopada. Sentia como se fosse a primeira vez que chorava.
Pegou um copo d'água. Tentou respirar fundo.
Conseguiu. Por breves instantes, as lágrimas começaram a cessar.
E voltaram novamente.
Esse ciclo respirarfundo-beberágua-chorar durou por um bom tempo ainda.
Nossa vida é agua, 70% do nosso corpo.
Sem ter a janela para pará-la, a chuva começou a inundar o quarto. Irrompeu violentamente sem esperar permissão, o vento se divertia e preenchia o ambiente de som e vida, vasculhando todos os cantos.
Parecia ser o fim.
A menina brincava alegremente, sem se importar com as folhas de caderno que voavam, ou com o piso de madeira ("que estraga na chuva!"), ou mesmo com sua cama encharcada. Nada mais parecia importar.
O moleque sentou-se. Já não chorava.
Só não queria pensar, parecia afoito. Ligou o aparelho de som no volume mais alto que podia. Parecia que tentava fazer com que a música preenchesse toda sua mente, ocupando assim qualquer espaço que algum pensamento pudesse querer ocupar.
Mais alto. Mais alto. Mais alto porra!!
Depois de um breve período de insanidade, a tempestade acabou.
A menina fechou a janela.
Olhou em volta para seu quarto, estava todo bagunçado, molhado, desorganizado e feliz.
Mas ela não parecia se importar com mais nada, começava a esboçar um sorriso, e quase podia-se ouvi-la assoviar uma canção.
Foi até a porta da sua casa, parecia que finalmente iria sair depois de tanto tempo. Abriu a porta confiante.
Se pudessemos ler os pensamentos dela nesse instante, nos surpreenderíamos.
Um fim nunca é apenas um fim. E o que parece ser um fim pode ser na verdade, dois novos começos.