Percebi que adoro pequenos momentos de arte... Síndrome moderna: adoro clipes, propagandas, trailers, contos e poemas modernos. Rápidos, indolores e que conseguem se encaixar em nosso corrido cotidiano... Fast-food para a alma.
-------------------------------------------------------------------------------------------
Um pequeno conto no cotidiano
A pequena garota sentou-se no banco de madeira que estava no meio do jardim. Sorriu, tímida, escondendo os olhos do sol. Tentou movimentar as nuvens que sobrevoavam sua cabeça, mas as nuvens pareciam não ligar para ela. As nuvens, tranqüilas, iam e vinham, crescendo, brigando, se amando, se matando e se dissipando, sem se importar com a pequena menina que apenas escondia seus olhos do sol.
Apesar de pequena, ela havia envelhecido, não havia dúvidas disso e foi isso que me espantou quando a revi pela primeira vez. A imagem que eu guardava dela em minha mente era a de sua juventude inesgotável, de suas feições suaves, de seus gestos harmoniosos e principalmente da maneira repentina como rompia o silêncio, e saia falando animadamente, quase gritando, como se saísse de um transe. Nesses momentos ela se revelava totalmente o oposto do que parecia há alguns segundos atrás e meu encantamento por ela só aumentava. Sempre imaginei-a estaticamente igual, eternamente envidrada por aquele ar de beleza que transpirava pelos seus poros e que transformava o mundo ao seu redor, mas o tempo realmente havia deixado suas marcas.
Tal foi meu choque ao revê-la, que à primeira vista não tinha certeza se era realmente ela. Olhei de longe, talvez não fosse... Teria eu me enganado?
Fui me aproximando, chegando perto, cada vez mais desconfiado, de mansinho, para não chamar sua atenção. Não sei se ela me percebeu chegando, mas de repente ela abriu um sorriso, mas um sorriso daqueles sorrisos que é como se fosse milhares, e isso me paralizou. Era ela. Sem sombra de dúvidas. Não olhei para cima para confirmar, mas tenho certeza que naquele momento as nuvens pararam para olhar para baixo. Sua beleza poderia até ter se desgatado com o tempo, suas feições poderiam estar gastas e já davam mostras de serem mortais e passageiras, mas seu charme, envolvente, morno e sedutor era algo intrínseco a sua natureza, algo do qual ela nunca se disassociaria, algo que nada, nem ninguém poderia arrancar dela, nem ela mesmo, se assim ela quisesse. E aquele sorriso era a personificação de tudo aquilo que poderia ser e de tudo aquilo que não era.
Nesse momento não agüentei, coloquei o papel de lado e parei de escrever. Estava emocionado ao ver a personagem que eu criara há tanto tempo, crescida, sem que eu tivesse presenciado quase nada desde sua criação, sem que eu tivesse ido lá e dado vida a ela. E ela já estava tão diferente de como eu a lembrava, de como eu planejava que ela iria se tornar. Sua beleza antes tão vistosa não era mais a mesma, mas isso não importava, o que me atraia nela não era mesmo sua beleza que ao poucos foi se esgotando, mas o seu charme.. ah... seu eterno charme que resiste e resistirá ao tempo e ao cinismo das pessoas...
Chorei por um tempo lágrimas inexplicáveis e, ao voltar meus olhos para o papel, ela já tinha ido...
-------------------------------------------------------------------------------------------
0 Comments:
Postar um comentário
<< Home